sábado, 2 de fevereiro de 2008

Contos Sobre o Café.




Em vias de botar quente neste blog que estava, quase inoperante, aí vai o primeiro capítulo do primeiro conto: "Café Amargo"

Sirvam-se à vontade!


Café Amargo


... 1 ...

Sentado, mesa a mesa com quem ele menos queria encontrar naquela noite, seria sonho? Seria devaneio? Efeito da sexta rodada de chopp? Não. Era pouco ainda... Ele sorria, tentando entender todas as voltas que já dera na vida... Uma a menos, não ia fazer falta. “Deixe que ela encontra o que procura” – Pensou logo, na tentativa de afastar o pensamento de ir sentar-se com ela, os pseudo-amigos e a escória que a observava.

Desde que o outono caíra, tem sido assim. Adriano Souza Inácio tem se metido em voltas sem começo e sem fim. Depois que abandonou a vida ao lado de Lídia, sua até então, companheira de farra, de bebidas, de noites longas sobre a cama, de viagens, de uma infinidade de prazeres que seria impossível descrever em poucas linhas...

As voltas aproveitavam da boa vontade do homem em sorver cada minuto como se fosse o último. Como se a morte estivesse à espreita e Adriano brincava com ela. Levava uma vida ao lado da morte, como se essa, nunca fosse bater a sua porta. E se isso acontecesse encontraria um sorriso jocoso dizendo: “Por que demorou tanto?”

“Antes a morte, do quê Lídia...”. Dizia. Desdenhando da própria sorte.

Mas aquela não era uma noite comum. Lídia Aquino Moura tinha saído das catacumbas. Certo que sua expressão era detestável. Mas ele conhecia o olhar. E o que havia por trás dele. Daqueles olhos cor-de-mel. Eles escondiam uma fantasia pela vida. Que ora se manifestava em festa. Ora em depressão profunda. Desconhecida. Assim a qualificavam até mesmo suas amigas mais íntimas. E Laura. Ela estava lá. “Lídia, você é imprevisível. Louca e imprevisível!”

Mas desviou seu olhar de Laura. Loira. Atlética. Diferente de Lídia que envergava um corpo extremamente esbelto, beirando a anorexia. Laura Antonelle era dessas mulheres desperdiçadas pelo alto nível intelectual. Que beirava a caretice. “Vai, olhe pra outro lugar!” – Pensou Adriano, se envergonhando de ter dado atenção demais pra quem mais encorajou-o a deixar de fazer a amiga colher frutos malditos da relação.

Pega um pedaço de papel. Laura já o percebe, sorri para amiga. Dá um tapinha nela e cochicha ao ouvido. “Mas que entediante. Aquela vaca pensa que estou ainda afim da Lili!” – Fala para o parceiro, Ronaldo, turbando a paz do amigo que estava a flertar com outras garotas ali.

“Ronaldo!... Porra! Presta atenção aqui...” – “Já falei... Não compensa... Não... Não me diga que vai escrever bilhetinhos??? Fala sério! Que tempo você tem hem? Levanta e vai falar com aquelas garotas ali...” Interrompe.

É certo. Que durante o bate boca entre os dois, Adriano retira da cabeça a idéia de rabiscar palavras surdas e passa a desenhar seu rosto no espelho. Tinha inveja. Do desprendimento de certos artistas. Desprendimento das formas perfeitas. Lembra de Picasso. Lembra de Rembrant. Lembra de Monet. E lembra que deixou o desenho, a pintura, a arte, pra se embrenhar em uma bela faculdade particular, gastar horrores, pra servir de “garçom” em uma empresa exportadora. Era o que ele dizia. Preferia horas desenhando a fio. Desenhos medíocres. A prestar contas. De suas decisões para a empresa. Dos resultados. Dos cafés que tomava... E que servia... Ria. Um sorriso saudavelmente irônico. Afinal, não existia melhor distribuidora de café, do que aquela em que trabalhava.

Um comentário:

Suco de Cérebro disse...

Classe...um dos poucos blogs de contos que não caem na onda de "malditos" nem de viadagens adolescentes...hehhehehhehehe
Bom conto cara.